[REVIEW] HAILSTONE (2022)
- garagisaloon
- 15 de mai. de 2023
- 5 min de leitura
Atualizado: há 6 dias

Lançado no fim de 2022, pela editora Darkside Books, HAILSTONE é um quadrinho western de terror escrito por Rafael Scavone e ilustrado por Rafael DeLatorre. A obra segue a história de uma pequena cidade, de nome homônimo, isolada durante uma nevasca brutal. Com a fome aumentando e sem ter perspectivas de sobreviverem ao inverno rigoroso, a população da cidade ainda precisa lidar com uma série de desaparecimentos e como isso está ligado à misteriosa instalação militar das redondezas, em meio a guerra civil estadunidense.
Como de praxe, fica o aviso que o texto pode haver spoilers da história.

UM OESTE… ESTRANHO
Definir HAILSTONE como um western é difícil, pois ele abrange vários outros elementos, passando por terror e até mesmo ficção-científica. Estar situado nas regiões geladas do norte do país também não ajuda, pois grande parte do imaginário popular associa o faroeste tipicamente com os desertos escaldantes da fronteira com o México. Mas não se engane, HAILSTONE é tipicamente um western, mesmo que siga outras receitas.
Usando de referência (ou quase uma homenagem) a filmes como O Grande Silêncio (1968), Mortos de Fome (1999) e Os Oito Odiados (2015), a ambientação de HAILSTONE usa a nevasca impiedosa como desculpa para manter seus personagens confinados a um destino claustrofóbico, tendo de lidar com problemas desconhecidos e mortais.
Nisso, tanto a escrita de Scavone quanto a arte de DeLatorre, acertam em cheio.

POR UM PUNHADO DE HISTÓRIA (E ARTE!)
A história é centrada na jornada do xerife Denton Ross que investiga uma série de desaparecimentos que assola a cidade nos últimos tempos. Com um rigoroso inverno assolando a região, as investigações estão a passos lentos, não apenas por conta do clima hostil, mas também por conta da instalação militar que, supostamente, abastece as forças da União na parte norte do país.
O que começa com um simples desaparecimento acaba se tornando uma conspiração que mudará a vida de Ross para sempre.

A narrativa de Scavone é bem construída e mantém o suspense até o fim, com reviravoltas surpreendentes e momentos de tensão crescente. Scavone faz um excelente trabalho em manter os personagens complexos e interessantes, que têm motivações claras, apesar de superficial. E digo superficial, não como demérito, mas porque a história em si é fechada e, relativamente, curta.
Scavone utiliza suas técnicas de storytelling para centrar o dilema de HAILSTONE na investigação de Ross e evita cair em armadilhas de querer se aprofundar mais do que precisa.
De Latorre também faz um trabalho incrível na arte, criando uma atmosfera sombria e opressiva que complementa perfeitamente a história de Scavone. O uso de sarjetas (o espaçamento entre quadros na página) escuras, emula perfeitamente a opressão que a história precisa passar.
Seu traço é limpo o suficiente para entendermos as nuances de cada personagem ao mesmo tempo que é pesado para criar sua atmosfera de tensão.
As cenas de ação são particularmente impressionantes, com um senso de movimento e dinâmica que realmente fazem você sentir a intensidade do combate.

O BOM, O MAL E… A CRIATURA
Como um bom Weird Western, HAILSTONE possui algumas reviravoltas interessantes que levam o aspecto de horror gótico do western sombrio a outro patamar. À medida que corpos começam a aparecer, nos deparamos com a criatura que assola a região, algo que os autores mantêm em segredo a sete chaves, fazendo você se perguntar de onde ela surgiu até o último capítulo. A revelação do porque daquela cidade estar amaldiçoada por tal criatura não decepciona quem chega até as páginas finais.
Scavone amarra, com simplicidade invejável, as perguntas que a história joga na mesa durante os capítulos. Seguindo o xerife Ross descobrimos não só quem está por trás dos desaparecimentos, mas por que e como, trazendo uma satisfação ao virar a última página.
E falando em antagonismos, pessoalmente, tenho certo apreço por histórias que evocam o lado tirânico e vilanesco do exército estadunidense e Scavone acerta no ponto em mostrar a arrogância do capitão Spencer, que, apesar da criatura rondando a cidade, é o verdadeiro antagonista, ora recusando em destacar uma guarnição para ajudar nas investigações do xerife, ora negando comida para a população da cidade, sob o pretexto de estarem em guerra.
HAILSTONE: UMA TERRA ROUBADA
É comum eu sempre voltar a este ponto em cada texto meu, sobre como qualquer narrativa western se baseia em uma história de massacre contra o povo nativo. Com isso, qualquer apagamento sobre este sofrimento, eu tendo a criticar pontualmente.
HAILSTONE trabalha com incrível sutileza, a representação do povo Blackfoot, mesmo de forma superficial. Aqui, novamente, eu pontuo que não falo de forma pejorativa, por que acredito que Scavone não precise entrar em uma profundidade a mais, já que a premissa não seria sobre o povo Blackfoot.
Dito isso, achei interessante o modo como as histórias dos dois povos se encontram, principalmente sob o olhar do ajudante do xerife, o jovem Tobias.
Sendo nativo do acampamento indígena perto da cidade, Tobias nos mostra como é a vida de um nativo dentro da comunidade branca da época.
Existe um ponto que normalmente me incomoda em narrativas no gênero quando tange a cultura nativa, que é mostrá-los como gurus, abrindo caminhos para o protagonista através de magias espirituais, elevando sempre a figura do indígena a um estereótipo místico. HAILSTONE flerta com essa narrativa, mas não me incomodou tanto, porque ele mostra outras camadas, tanto através do acampamento Blackfoot quanto do próprio Tobias.

BÔNUS: A CONFEDERAÇÃO BLACKFOOT
Também conhecido originalmente como Confederação Niitsitapi, que significa "Os Povos Verdadeiros", os Blackfoot são um dos povos originários norte-americano que se encontram na divisa do EUA com o Canadá, na parte norte do estado de Montana.

É um povo que originalmente vivia através da caça do bisão americano, o que faz eles terem semelhanças com os povos das Grandes Planícies.
A sociedade Blackfoot se dava através de Bandos. Tendo de 80 a quase 300 indivíduos, os Bandos eram formações sociais que se davam de forma espontânea, sem ligação familiar, o que significava que qualquer integrante de um bando poderia sair e se juntar a outros bandos sem pressão social. Apesar de se criar diversos conflitos por lideranças, os bandos eram uma maneira que os Blackfoot encontraram de sobreviver formando alianças temporárias com outros membros em momentos mais difíceis.

Uma herança deixada pela Confederação Blackfoot foi o Okan, a Dança do Sol, uma celebração anual onde todas as 4 nações Blackfeet se juntavam para uma caça sagrada, além de reforçarem a ligação que cada nação tinha com a confederação.
Apesar da importância social que o Okan tinha para os Blackfoot, as leis de assimilação, através das reservas nacionais, quase fizeram com que a cultura dos Blackfoot fossem apagadas.
Com o desaparecimento dos bisões, graças as políticas de genocídio indígenas perpetuadas pelo governo estadunidense, a Confederação sofreu o mais forte golpe no fim do Sec XIX, com o que os historiadores chamam de o "Inverno da Fome", pois todas as nações blackfoot sofreram com a fome durante o período.
Apesar de todas as agruras, hoje a Confederação Blackfoot promove sua rica cultura através de programas sociais em suas reservas, mantendo viva a história de um povo guerreiro.

O INVERNO INFERNAL DE HAILSTONE
No geral, HAILSTONE é uma obra excelente e recomendo para quem gosta de quadrinhos de terror e faroeste. Scavone e De Latorre criaram uma história envolvente e visualmente deslumbrante, que certamente vai deixar uma marca duradoura nos leitores.
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