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[REVIEW] Um review honesto de Red Dead Redemption II

Atualizado: há 6 dias


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Uma história de redenção.


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Quero começar falando que o texto contem Spoilers (estejam avisados!), então leiam por sua conta e risco. Pretendo fazer um texto longo, por que preciso tirar isto do meu sistema, o jogo merece. Dito isso, vou passar rapidinho nos outros títulos antes da gente continuar.


Em 2010, Red Dead Redemption lançou como um sucessor espiritual de Red Dead Revolver, em 2004, e embora tendo quase o mesmo nome e temática, não possuem nenhuma ligação direta (não sem uma dose não-confirmada de conspiração). A história de Revolver gira em torno de Red, um pistoleiro atrás de vingança, enquanto a história de Redemption, gira em torno de John Marston, um rancheiro, outrora fora-da-lei, que se vê obrigado a caçar seus antigos companheiros.


Joguei os dois e embora o primeiro ser um jogo linear, é divertido. Começou com o sistema DeadEye ( que desacelera o tempo, permitindo você marcar ponto vitais de vários oponentes e lançar uma saraivada de balas) e dava um toque de um Western sujo e empoeirado, digno de Sergio Leone. Tanto que a música tema do jogo é o maravilhoso Lo Chiamavano King, de Luis Bacalov, tema do filme homônimo de 1971.




Red Dead Redemption já é outra história e explicar o que é esse jogo para mim, teria de fazer um texto a parte. Mas a Rockstar Games, empresa responsável pelo desenvolvimento do jogo, soube pegar a essência do mundo western, principalmente o Spaghetti Western e mesclar com sua jogabilidade, oriunda de jogos como Max Payne e GTA, e trazer um produto profundo, com temas e personagens marcantes e um final que fecha o arco de vingança.


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Com tudo isso claro, chegamos a Red Dead Redemption II. Desde o começo a Rockstar Games deixou explícito de entregar um produto onde a experiência é aproveitar o mundo a sua volta, como um pistoleiro do Velho Oeste aproveitaria.


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Um resumo rápido, diferente dos títulos anteriores, Red Dead Redemption II se passa 12 anos antes do Red Dead Redemption e conta a história de Arthur Morgan, braço direito do chefe da Gangue Van Der Linde, Dutch. Como Arthur, você testemunha a degradação do bando de Van Der Linde, e testemunha em primeira mão os eventos que moldam a história do primeiro jogo (e quando eu disser primeiro jogo, entendam como Red Dead Redemption).


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Como um produto de entretenimento digital atual, o jogo abrange muito os aspectos técnicos que eram limitados no primeiro jogo. Ou seja, temos um mapa maior, as mecânicas do DeadEye estão aprimoradas e mecânicas que estavam ausentes no primeiro jogo, estão presentes neste, já que foram 8 anos de desenvolvimento tecnológico na área de games, e Red Dead Redemption II leva os aspectos gráficos e narrativos a um patamar maior sem medo de seguir fora das sombras de seu predecessor. Ainda sobre os mapas, apesar de New Austin estar presente no jogo, é mais por uma questão nostálgica, mas não faz diferença nenhuma na narrativa, tirando a apresentação da Gangue Dos Lobos (a não ser se tivermos alguma DLC que se passe lá).


Red Dead Redemption II é um produto ousado da Rockstar Games. Ela não tem medo de deixar o jogador solto no mundo, a sua própria deriva e deixá-lo decidir sobre como vai explorar tudo e seguir com a história. Existe marcadores no jogo representando as missões principais e secundárias, mas é tudo tão orgânico, que confesso que me deixou confuso de primeira. Quando digo orgânico, vou deixar um vídeo do Luke Stephens, onde ele fala da regra dos 80 Segundos dos jogos.



Pra resumir o vídeo, para jogos Sandbox, existe uma “regra” dos desenvolvedores, onde, para não deixar o jogador se entediar com o jogo, apenas andando de um ponto a outro, eles colocam pontos de interesse, que deixam o jogador entretido entre uma missão a outra. Posso citar como exemplo o The Witcher 3: Wild Hunt. Se você quiser subir uma montanha, lá no topo irá ter algo de interesse pro jogador. Dando aquela sensação de recompensa. Pode ser um ponto de poder a mais, ou algum item importante. De regra, por volta dos 40 segundos, sempre irá ter algo pra entreter o jogador.


Em Red Dead Redemption, no primeiro jogo, temos como exemplo a armadilha da mulher com os bandidos, alguém querendo roubar seu cavalo, enfim, vários eventos aleatórios que vão entretendo com o tempo. Em Red Dead Redemption II, você não tem isso. Você tem o mundo a sua volta. Existem os evento aleatórios, mas são escassos (pelo menos na minha concepção). Existem coisas a serem exploradas, mas elas não estão na sua cara, não existe um ponto de interrogação mostrando onde você deve ir.


No começo, confesso que senti falta das interações. De algo entre meu ponto A ao ponto B que me obrigasse a fazer algo. Que mostrasse o que eu deveria fazer. Nas minhas primeiras horas, esperava aquela profusão de tiroteios e personagens carismáticos e momentos impactantes, e surpreendentemente me vi cavalgando, com uma paisagem bucólica a frente e vi esse vazio inicialmente como algo negativo. Porém, lá estava eu, cavalgando e o mundo a minha volta estava vivo (tá, eu sei que podemos citar vários jogos como exemplo de mundo aberto, até mesmo o primeiro, mas continue comigo!). Quando falo vivo, é num sentido bem mais íntimo e orgânico. Eles pegaram as mecânicas de jogos SandBox, e elevaram. Chegue em uma cidade e verá um local sendo construído. Os trabalhadores estarão ali, seguindo uma rotina de trabalho e descanso, até o final. Segue um vídeo, do DefendTheHouse, onde ele seguiu alguns NPC’s durante um dia para relatar suas rotinas:


E nem tô citando os animais, que com suas 200 espécies no jogo, cada um possuindo uma rotina, ciclo predador X presa e habitat. Até o modo de ataque e fuga de cada um é específico. Locais de interesse estão imersos no ambiente, como uma cabana abandonada, que pode conter uma arma rara ou uma gruta com panfletos de elixires miraculosos espalhados. Tudo isso está disponível para o jogador que tenha boa vontade de gastar um tempo no mundo imersivo que a Rockstar Games montou com muito cuidado.


Porém, aqui eu abro um espaço para fazer uma crítica negativa. Como nem tudo é mar-de-rosas, o jogo sofre de momentos onde ele se arrasta em certos conflitos e introduz personagens que em nada acrescenta à trama central. E não são apenas coisas isoladas, mas todo um capítulo (sim, Guarma, estou falando de você!)! Mas, por sorte, a coisa toda volta nos trilhos e podemos desfrutar da história de redenção de Arthur.


Independente deste entrave, o legado de Red Dead Redemption II no mundo dos games vai ser esse de não mimar o jogador com coisas explícitas. O mundo existe, tá ali ao seu alcance. Explore, roube, mate, conquiste, salve, mas não espere que o jogo mostre isso pra você ou entregue de mão beijada. Porém, nada é incluído no jogo sem que se tenha uma explicação, nada é mostrado apenas para mostrar o quanto o jogo é bonito e quanto a tecnologia se desenvolveu. Tudo gira em torno da história. Tudo gira em torno de John Marston.


Mas tô me adiantando. Vamos falar de Arthur Morgan e sua história.


O jogo começa em meio a uma tempestade de neve, onde descobrimos (com um prólogo cinematográfico digno de Os Oito Odiados) que um assalto deu errado de forma homérica e o bando está sendo caçado sem piedade até os confins das montanhas do Norte. Você, como Arthur, precisa manter a moral do bando, através de mantimentos em geral. Resumindo, é neste capítulo que você aprende os controles gerais do jogo, além de aprender o básico do lore. Voltando ao Oito Odiados, este prólogo, principalmente devido a sua trilha sonora, entrega um capítulo tutorial imersivo e que serve de base para toda a história futura. Nos aspectos técnicos, o jogo mostra a que veio. A nevasca e a própria neve, são o ponto alto do capítulo. O modo como ela interage com as ações do jogador, se formando através de pegadas ou corpos caídos, é maravilhoso. Somando à música ambiente, o capítulo entrega uma base sólida sobre o que são e como pensam os personagens.


Enfim, logo depois que a nevasca passa e o bando é permitido a descer das montanhas, Dutch decide ir para o Leste, enfrentando resistência de Hosea, outro fundador do grupo junto com Arthur, e do próprio, já que o plano era eles irem para o Oeste. Com a lei na cola deles, eles aceitam irem para o leste, seguindo o plano de Dutch. É neste momento que o jogo te entrega para o mundo aberto Red Dead Redemption II.


Como é de praxe nos jogos da Rockstar Games, Red Dead Redemption II não é um jogo de RPG per si, pois nenhuma das ações do jogador influenciam o final. Ele sempre vai ocorrer, independente do que você faça, salve, mate ou fale. Porém, o modo que ele lida com toda a jornada de Arthur Morgan, faz total diferença e, em muitas vezes, eu classificaria o jogo como um RPG, por que, independente do final da história, todo o resto é influenciado por Arthur. E eu digo isso mais pelos seus companheiros de gangue.


Ao todo são 23 personagens na gangue Van Der Linde e você vai gastar muitas horas com estes personagens, pois eles foram escritos de maneira excepcional pela Rockstar Games. Cada um vive de maneira diferente. Os diálogos, movimentos e hábitos de cada um faz você, como jogador, se entreter por suas histórias. A moral do acampamento é tão importante quanto a barra de vida de Arthur. Um dos pontos altos do jogo é quando o acampamento está festejando e você se junta a eles para cantar, dançar e se divertir. No meu caso, que acabei o primeiro jogo, ver aquilo e saber que, inevitavelmente, terá um fim, me deixou com um gosto amargo na boca.


Arthur Morgan é um espelho do jogador em todos os sentidos. Ele começa leal a Dutch, que é um personagem carismático que se mostra preocupado com sua família. O diálogo de abertura de Dutch mostra o quanto os últimos eventos afetaram ele e os seus e é genuíno nos seus sentimentos. Assim como a programação “força” o jogador a certas atitudes (como cobrar os empréstimos de Herr Strauss), Arthur também se vê forçado a praticar tais atos. Em vários momentos, em seu diário ele chega a achar tais ações abomináveis. Para ele ser fora-da-lei não significa bater em pobres e miseráveis, mas se manter resistente a um sistema capitalista que só beneficia os ricos. Em vários momentos a gangue é vista como pária por não se adequar ao progresso (a cinematic de entrada a Saint Denis é um soco no estômago e me faz refletir até hoje sobre como evoluímos como sociedade).


A medida que a gangue vai se isolando cada vez mais por conta das autoridades, mais Dutch vai perdendo sua consciência social e descendo em uma espiral de desespero, desconfiança e medo. Chegando a um ponto, onde tanto Arthur, quanto nós, como jogadores, já não temos certeza se aquilo que estamos fazendo é o certo.


E é neste jogo que percebemos o quão certo é o nome Red Dead Redemption pra franquia. No primeiro jogo, apesar do nome, pra mim, a história sempre foi uma causa e efeito da vida de John Marston. Ele não tava buscando redenção, mas forçado a fazer coisas por conta do seu passado. Já Red Dead Redemption II, a jornada de Arthur Morgan é uma redenção honesta pelos seus atos. A conversa entre ele e a freira na estação, é uma que me tirou lágrimas dos olhos.


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E falando em momentos emocionantes, Red Dead Redemption II é cheio destes momentos. Na ansiedade de jogar, eu esperava ver momentos como, na entrada do México, no primeiro jogo, toca a música “Far Away”, de José Gonzales, inesquecível, depois de um tiroteio e com o sol nascendo atrás de você, enquanto cavalga as planícies mexicanas. Porém, Red Dead Redemption II entrega pequenos momentos intimistas, onde Arthur se mostra vulnerável, ou irônico. As pessoas a volta dele orbitam para mostrar ao jogador que você vai ser lembrado pelo que você fez com outros.


Com Honra alta, as pessoas lembram de você como alguém caridoso e gentil. Se sua Honra for baixa, elas lembrarão em como você era solitário e taciturno. Independente dos dois, as ações do jogador serão lembrados por aqueles a sua volta. Principalmente por John Marston. O que me leva a ele novamente.


Gosto de pensar que o John Marston que conhecemos no primeiro jogo, é espelho de Arthur Morgan. Por mais que ele seja o protagonista, Arthur é um avatar do jogador para acompanhar a história de John Marston e de testemunhar os eventos, em primeira mão, que antecederam a base que foi o primeiro jogo. Você acompanha o declínio da sanidade de Dutch e em como isso afeta Marston e sua família. Não vou entrar no mérito dos epílogos, mas você termina Red Dead Redemption II com a sensação que tudo no primeiro jogo faz sentido.


A tão falada redenção do título se deve a um ciclo vicioso que a vida de Marston segue. Os epílogos servem para mostrar o quanto ele se esforçou para se tornar uma pessoa melhor, tanto pra ele quanto pra sua família. Abgail é um farol na vida de Marston, tentando fazer as coisas funcionarem, não só para eles, mas para Jack. O distanciamento do filho é íntimo o suficiente para você se relacionar. Por mais que eles se esforcem, Jack não tá na mesma sintonia, e isso se agrava com o tempo. As mentiras, mudanças e violências afetaram ele, e por mais que você tenha sua vingança no fim do primeiro jogo, você sabe que a vida de Jack nunca vai mudar, assim como a de seus pais.


O ciclo de violência segue e é implacável. E você, como Arthur, acompanha isso desde o começo. O legado da violência, sempre será a violência.


Posso continuar por mais linhas explicando as referências entre os filmes ou do original que temos no jogo, mas acho que o ponto foi feito. Red Dead Redemption II é um jogo que mostra a que veio.



Este texto foi publicado primeiramente em 24/11/2018, aqui


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